Se alguém me pedisse para descrever os dias de hoje em poucas palavras, eu diria: temos visto, a olhos nus, o crescimento de uma sociedade do absurdo. “Mas, sempre existiram pessoas, ideias e atitudes ruins no mundo”. De fato, porém, não havia internet e o acesso à informação em tempo real.
É impossível estar no Brasil nos últimos dias e não saber dos episódios envolvendo um podcaster conhecido por suas ‘opiniões polêmicas’ – um grande eufemismo, travestido de ‘liberdade de opinião’ na tentativa de tornar aceitável o inaceitável – e um jornalista, poeta e escritor que, nos últimos meses, distribui comentários questionáveis naquela que já foi uma das principais emissoras de rádio do país.
Me permitirei não citar nomes. Nem de pessoas, nem de veículos de comunicação. Não será necessário – e isso é, por si só, bem impressionante.
Tanto o podcaster e ex-gamer quanto o comentarista político e ex-BBB foram demitidos. Foram apenas demitidos. Até agora.
Em um movimento semelhante ao Stop Hate for Profit, tema sobre o qual já escrevi, as marcas patrocinadoras do podcast em questão decidiram, imediatamente, cancelar seus contratos. Mas, a reflexão aqui não se trata de cancelar os contratos de patrocínio, mas sim de haver o patrocínio. Na era da informação – o que é quase uma ironia diante dos absurdos recentes – é inaceitável que grandes empresas decidam destinar seus investimentos de mídia a canais liderados por profissionais despreparados e com comportamentos reprováveis.
O risco é muito grande, não vale a pena, não é recomendável. De um lado, marcas estabelecidas, fortes e reconhecidas unem suas imagens a pessoas que destilam ódio, cometem crimes, propagam desinformação e atuam, propositalmente ou não, para que a sociedade retroceda.
Aproveitando o exemplo da emissora de rádio, vemos, boquiabertos, o declínio intelectual, jornalístico e, principalmente, de bom senso de grandes veículos de comunicação que sob a desculpa esfarrapada da ‘liberdade de opinião’, contratam ‘profissionais’ lunáticos. Vale frisar: de um extremo a outro. Dar voz a extremistas é abrir portas para o cometimento de crimes diversos, e em rede nacional.
Demitir uma pessoa que faz apologia ao nazismo, que minimiza questões raciais ou que gesticula como Hitler ao vivo é remediar uma situação que poderia nunca ter acontecido caso estes ‘profissionais’ não tivessem voz para destilar seus crimes aos ventos.
Sim, crimes. A Lei nº 7.716/1998 é clara quanto ao nazismo, ao racismo e a outros tipos de discriminação, inclusive com atribuição de penas que vão de dois a cinco anos de reclusão.
O que estes movimentos refletem? O Brasil que, infelizmente, vem sendo construído pelos brasileiros. Flertes com os extremos, crescimento de grupos neonazistas, normalização dos ataques às minorias, entre tantos outros.
É absolutamente dispensável dizer o que foi o nazismo e o quanto é inaceitável – além de ser criminoso – fazer qualquer tentativa de normalizá-lo, aceitá-lo, resgatá-lo ou compará-lo.
A pergunta que fica é: até quando?